quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Décimo Segundo Capítulo

Leonardo tinha chegado a casa exauto com a reunião e com a visão de Helena. Não pregára olho a noite inteira a pensar no que ele queria fazer. Decidira conversar seriamente com Carlos no dia seguinte e fazer as suas exigências, não queria continuar uma marioneta nas suas mãos, nem tornar-se num daqueles homens insensíveis. Colocaria tudo em pratos limpos.
O motorista encontrava-se como de costume à porta do prédio, à hora marcada, sempre pontual, nem um minuto a mais, nem um minuto a menos. Às nove da manhã, Leonardo já se encontrava na sede de campanha. Começava agora a correria, com a entrada e a saída de pessoal atrapalhado, ocupado e distante. Ele passava por entre um mar de gente e ninguém notava na sua presença. Como poderia ser aquilo possível? Não era suposto ser ele o homem mais importante ali! Subiu a pequena escaderia até ao primeiro andar e decidiu esperar por Carlos no seu território, no seu escritório.
Chegára atrasado. Passava das nove e meia quando apareceu ofegante na sala. O rosto surpreso pela intrusão depressa desfez-se e o inicio da interrogação não se fez esperar.
- Que faz aqui, Leonardo? Algum problema?
- Vários problemas. Mas para mim o mais urgente é o assunto relacionado com a situação do meu irmão Tiago.
- Que não lhe tire o sono, meu caro. Esse assunto está a ser tratado.
- Tratado? De que forma? Á uma semana que espero que me diga quando o posso ir buscar. Tenho feito tudo o que me pede, nem tenho tido tempo para o visitar. Parece que já sou o Presidente da Républica! Quando? Pergunto eu.
- O que se passa é que temos andado ocupados com a venda da sua imagem, temos ainda o assunto das assinaturas e o André e a Sofia andam atrapalhados com a confirmação dos seus dados. Não queremos que nada seja esquecido. Ainda hoje a Sofia foi para o Porto.
- Nada seja esquecido! Não parece. Estão a esquecer-se da única família que tenho...
- Única? O André anda a tentar encontrar o seu pai e as suas irmãs. Não está assim tão sozinho.
- Eu não quero nada com esse homem. - a expressão cordial de Leonardo alterou-se - Exijo que esqueçam essa personagem e concentrem-se em trazer o Tiago para junto de mim.
- Exije? Meu caro, não é bem assim. Nós sabemos o que é melhor para si e o melhor é apagar qualquer mágoa com o seu pai, para ele não usar isso contra si em campanha. Depois arranjamos uma ama para tratar do seu irmãozinho doente.
- Ele não é doente! Não é preciso uma ama. Eu estou aqui agora a tempo inteiro.
- Não vai querer arrastá-lo para o seu mundo?! Por amor de Deus! Aparecer uma vez para os repórteres verem e transmitir apoio aos deficientes é uma coisa, mas agora carregar com o atrasadinho para todo o lado na campanha. Nem pensar! - Carlos foi cruel.
A temperatura aumentou e Leonardo sentiu o coração parar. Do punho fechado escorria uma gota de sangue. À porta André estava incrédulo.
As palavras feriram Leonardo e naquele momento o tempo parou. O sangue não era seu, jorrava da boca de Carlos. Leonardo nem sentira, quando atingiu a cara de advogado. A ira que o atingira deixara-o sem reacção. Como tudo aconteceu? Não sabia, mas aconteceu.
André entrou e arrastou Leonardo em silêncio para o exterior. Carlos ficara sentado na sua cadeira de pele, no seu escritório, com a mão sobre o lábio, chocado. Talvez não esperasse. Pensou no que tinha acontecido ali e reflectiu.
- Estás doido? O que é que te deu ali dentro Leonardo? Bateste no Dr. Vaz. Como é possível! - disse gritando André, desviando-se da mira de Leonardo com medo que este o agredisse também.
Leonardo continuava a olhar para a mão, que inchara. Pela primeira vez tinha batido em alguém, tinha se sujado com sangue que não era o seu. Olhou André, os olhos transmitiam angústia e dor.
- Dei-lhe um murro? Eu agredi o Carlos! - disse bem alto para que talvez fizesse sentido e recordou o momento - Dei-lhe um murro... mercido. Agrediu os meus sentimentos, fez pouco do meu irmão, da minha família. Quem aquele homem pensa que é? Deus.
- Não sabes o que fizeste? Acabou. Acabou tudo. A campanha, o sonho, tudo. Podes bem pensar em procurar emprego. Bateste no homem do dinheiro. O que tinhas na cabeça? Ele não sabe o que dizia. Esquecias, fazias orelhas moucas. Bateste-lhe!! - André só sabia repetir a mesma coisa. Parecia uma criança em pânico após ter partido alguma coisa do pai. Encontrava-se completamente perdido.
- Não tenho medo de procurar emprego. Sempre trabalhei, não tenho medo do trabalho. Quanto ao Sr. Dr. tem muito que se desculpar.
André ouviu irrequieto e viu sair Leonardo pela porta da moradia. No cimo da escadas encontrava-se um homem ferido no orgulho. Carlos olhava a porta aberta, por onde tinha saído o seu candidato. Não gostava daquela sensação de perda e desilusão. Era orgulhoso, mas agora era ele que errara e era de Leonardo que precisava. André viu-o sair pela mesma porta atrás de Leonardo e pensou que aquele homem estava disposto a tudo para ganhar as eleições, até a humilhar-se.

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