sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Oitavo Capítulo

A máquina de café dava sinal do incio de mais uma manhã. O cheiro evadia não só a cozinha como toda a casa. Era um aroma delicioso que Sofia adorava. Agora sim estava pronta para mais um dia que adivinhava ser longo e difícil.
Chegara a casa por volta das cinco da manhã completamente estafada. A espécie de interrogatório policial tinha demorado mais do que o esperado e naquela altura achava-se capaz até de descrever o guarda-roupa completo de Leonardo. E que guarda-roupa? Pensava o quanto difícil iria ser reeducar aquele homem. Crescia dentro dela um sentimento inexplicável quando pensava nele. Sentira-se atacada quando lhe revelaram que o homem que esperava naquela saleta, seria o candidato perfeito às eleições presidenciais. E depois de toda a noite passada, a opinião que formara de início não mudára. Continuava a pensar que não tinham feito a melhor escolha. Que no fim tudo seria um castelo de areia, que atingido por uma onda do mar se desmoronaria assim como os sonhos de Carlos. Decididamente estava a preparar-se para uma desgraça completa.
Passava das oito da manhã e já tinha de se por a caminho para as instalações da campanha. Nem dormira, apenas tomara um banho e alguma espécie de pequeno-almoço. Tinha muito trabalho à sua espera. Para além de ter de confirmar toda a história de Leonardo, teria de arranjar uma casa para ele em Lisboa, paga pela campanha, obviamente. Porém o dia começava com a sessão fotográfica do nova candidato. Foi então que Sofia notou o quanto difícil iria ser o seu dia, se para além de tanto trabalho ainda tinha de servir de babysiter.
Chegou ao Beato por volta do quarto para as nove e Leonardo já lá estava. Como tinham terminado tarde ficara em casa de Carlos o que tinha sido benéfico pois sempre vinha bem apresentado, de fato e camisinha, ligeiramente descontraído. Porém, a capacidade de Sofia achar defeitos não tardou a evidenciar-se e choviam as criticas.
- Fato, camisa, sem gravata... Muito Bem! Um aspecto limpo, profissional, mas também descontraído porém, o guarda-roupa não é tudo. Muita coisa vai ter de mudar até se tornar um senhor. - disse Sofia friamente.
- Mas vamos no bom caminho! - sorriu Carlos.
- Eu faria melhor, Dr.! - interrompeu André - Com esse corpinho, vamos fazer melhor. - olhou para Sofia - Querida temos de por mãos à obra e tratar de ir às compras com este homem.
Sofia tentou esquivar-se de mais esta partilha de experiências e de se encontrar mais algum tempo com aquele homem. Não percebia porque tinha de estar presente, com tanto trabalho e além do mais, era jornalista não consultora de imagem.
Leonardo olhava desconfiado para cada gesto e cada pormenor de André. Sentia-se pouco à vontade. Desde o primeiro instante que notara que ele era homossexual, não que ele tentasse esconder, mas era claro na sua atitude e na sua linguagem. Pelo menos no modo como falava com ele. Querido, corpinho, fofo... Nunca tinha convivido com nenhum gay e não tinha qualquer problema, mas era mais forte que ele, não sabia como reagir e sentia um certo receio de André sentir-se entusiasmado com ele e desejar algo que não pudesse dar. Era claro como Leonardo gostava de mulheres e agora mais do que nunca sentia necessidade de demonstrar isso. Nem sabia explicar porquê. Coisas da vida, pensava.
Carlos escolhera um dos melhores fotógrafos de Lisboa para fazer as fotografias que iriam ser a cara de uma campanha independente. Começaram por tirar fotografias aos acessores como André, Carlos e até Sofia. Depois as fotos mais importantes. Demorou cerca de uma hora a sessão fotográfica do futuro candidato. Caras sérias, caras sorridentes, caras pensativas, caras de todo o estilo possível e imaginário. Uma manhã cansativa para fechar com chave de ouro a noitada anterior.
Eram cerca das onze da manhã quando Sofia conseguiu um tempo só para si. Entre tanto stress matinal apenas agora e por meros instantes poderia relaxar na confortável poltrona do escritório de André. Pensava no trabalho que teria pela frente pela centésima vez naquela manhã. Como as tarefas se multiplicavam e sempre que uma se cumpria, duas novas apareciam. Nos próximos dias teriam de arranjar 7500 a 15000 assinaturas de cidadãos portugueses eleitores para poderem entregar no tribunal constitucional, lá irinam ser confirmadas e estudado o perfil do candidato para por último, ser aprovado para puder concorrer às presidenciais. Tinham de correr e o pior é que teriam de confirmar o dossier com os dados de Leonardo antes de entregar as assinaturas no tribunal. E isso não demoraria muito, Carlos era influente e pelo menos o minimo de assinaturas já conseguira. Entre ricos e muito ricos, Carlos sabia desenrascar-se.
Nessa tarde a sua função começaria por tentar encontrar uma casa no centro de Lisboa. Após pesquisar bastante na internet e ter telefonado a algumas agências, conseguira marcar visitas a algumas para o próprio dia. O que iria custar mais era a presença de Leonardo, porém sabia que podia contar com André que não a largava por um segundo. Despachados desta emenda, seguia a tão desejada tarde no centro comercial. Desejada por André e temida por Sofia e até por Leonardo que até ao momento sentia-se como um rato de laboratório.
Sofia sabia que o dia iria acabar ali, naquele sítio sem alma, como ela tratava todos os centros comerciais e as grandes superficies onde tudo se vende e tudo se compra. A pesquisa séria iria ser adiada mais vinte e quatro horas, assim como a sua esperança de desenterrar algo digno de correr com Leonardo da campanha e da sua vida. Iria encontrar alguma coisa? Será que Leonardo é assim tão terrível? Ou Sofia apenas confunde sentimentos? Amor ou ódio? Atracção ou repulsa?

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